segunda-feira, 20 de dezembro de 2010


Menos Concursos e Mais Empresas

Manchete de um jornal de circulação nacional: “Não passou? tente outro concurso.” Um importante portal eletrônico traz no mesmo dia: “Concursos públicos oferecem 14,5 mil vagas em todo o país; pagam até R$ 19.643.” Tudo parece tão inocente e convidativo aos jovens deste País. Além disso, sem dúvida, concurso é inquestionavelmente a maneira adequada de o serviço público recrutar talentosos profissionais. Tanta verdade que esconde grande perversidade e desorientação educacional à nossa juventude.

Por trás dessa aparente contradição, revela-se o que pretende o País de seus jovens melhor preparados. Oculta o que é preparar profissionais para o futuro, um futuro que começa hoje. Preparar para concursos tem pouco a ver com enfrentar os desafios contemporâneos. Certamente os testes de ingresso, em geral de múltipla escolha, não conseguem captar características absolutamente relevantes de um profissional compatível com o presente e com o futuro. Assim, erramos no processo formativo e induzimos futuros profissionais, potencialmente bons, a reforçarem características e aptidões não relevantes.

Fruto dessa indução centenas de milhares de jovens se dedicam hoje à realização de concursos públicos. Mesmo quando aprovados em um deles, a maratona não se encerra nunca. Bastante comum assumirem e dedicarem-se em tempo quase integral a um próximo. É um sem fim de preparação, sem exercício pleno de profissão alguma. Se passam no executivo, assumem de olho num concurso do legislativo. Se com sucesso nos dois, há que se preparar ao do judiciário e assim por diante. O processo formativo reforça essa indesejável tendência e dela aferem lucros instituições que proliferam cursos preparatórios. São jovens talentosos mal orientados desperdiçando precisos tempo e dinheiro em atividades inócuas.

Diferentemente, o que devemos esperar de um profissional egresso de um curso superior é tudo menos o mesmo, se compararmos décadas atrás com os tempos atuais. Um grande complicador é que o que se espera atualmente, em termos de competências, inclui os requisitos de ontem, demandando, porém, novos importantes atributos, sem abrir mão dos anteriores. Um resumo de todas as mudanças está na diferenciação entre competências técnicas e competências múltiplas. Ambas igualmente importantes. Quando muito, em seu limite superior de eficiência, o concurso visa a captar limitadas competências técnicas.

O aspecto comportamental é absolutamente crucial quando um profissional depara-se com um problema inédito, um tema inovador ou tecnologias recentes. Se ao longo do período escolar, o qual é rigorosamente infindo, essas emoções, que preparam para enfrentar desafios, não foram trabalhadas, este suposto cidadão, ainda que dominando parcialmente as técnicas convencionais, terá enorme chance de fracasso. A competência de liderança dos futuros profissionais, a capacidade de trabalhar em equipe e de tomar iniciativa, a habilidade gerencial e a valorização do potencial criativo e da sensibilidade quanto ao ambiente em que estão imersos são atributos que raramente estão presentes nas avaliações, tanto dos estudantes de graduação como dos que fazem concursos.

Os estímulos às novas competências não menospreza o conhecimento tradicional e mesmo os procedimentos padrão de avaliação. Não se trata de substituir, mas sim de agregar. Ensinar não ficou mais simples, transformou-se em mais complexo, como a vida e o mundo do trabalho que nos cerca. Assim, se o que pretendemos é formar “concurseiros”, que permaneçamos fazendo o que temos feito. Caso contrário, que repensemos profundamente o que tem se praticado e subliminarmente estimulado nossos jovens a se constituírem. A nova mensagem de um Brasil que se pretende potência, com distribuição mais justa de oportunidades e renda, seria deixarmos claro o essencial: menos preocupação com concurso e mais estímulo a criarem suas próprias empresas.

Crédito foto acima: fotógrafo sueco Erixk Johanssen

sábado, 27 de novembro de 2010



Cenário promissor para a inovação no país



Sergio Machado Rezende e Ronaldo Mota

(publicado Jornal Folha de São Paulo, pág. 3, dia 08/11/2010)

Inovação compreende um produto ou processo novo, bem como a introdução de uma qualidade ou funcionalidade inédita de produto já existente; é fator decisivo para a competitividade das empresas. A atividade de inovação tecnológica requer a participação de engenheiros e cientistas, preponderantemente com formação pós-graduada.

Apesar do início tardio, a pós-graduação brasileira avança rapidamente. O número de mestres e doutores formados passou de cerca de 5.000 em 1987 para quase 50 mil em 2009.

A ciência avançou muito no Brasil; no entanto, a inovação tecnológica em nossas empresas ainda é tímida. Tal situação decorre da carência de cultura de inovação no ambiente empresarial e da insuficiente articulação entre política industrial e ciência e tecnologia.

Até recentemente, o principal instrumento para apoiar a inovação era o crédito da Agência Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), com juros da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) mais 5%.

Mas isso está mudando. Inovação é, hoje, uma das prioridades da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) e do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (Pacti). Com a Lei de Inovação (2004) e a Lei do Bem (2005), as empresas passaram a contar com instrumentos mais amplos e efetivos.

A subvenção econômica viabilizou a concessão de mais de R$ 2 bilhões não reembolsáveis para empresas realizarem inovação. Tal valor é complementado por outros investimentos reembolsáveis da Finep e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por meio de créditos com juros muito baixos.

O Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas (Pappe) aporta recursos para as pequenas e médias empresas em operação com parceiros estaduais. Adicionalmente, existem hoje mais de 30 fundos de capital de risco, com mais de R$ 3 bilhões para investir. O Programa Primeira Empresa Inovadora (Prime) concedeu em 2009 subvenção econômica para 1.381 empresas, por meio de parcerias com 17 incubadoras.

O Programa RHAE-Pesquisador na Empresa, por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), concede bolsas para mestres e doutores atuarem nas empresas, tendo contemplado, nos anos de 2008 e 2009, mais de 300 empresas, possibilitando a inserção de 507 mestres e doutores e 550 técnicos nas equipes de trabalho.

A Lei do Bem concede incentivos fiscais para empresas que realizem atividades de inovação. Em 2006, 130 empresas declararam investimentos de R$ 2,2 bilhões. Já em 2009, 635 empresas investiram mais de R$ 9,1 bilhões. O mais recente estímulo para inovação vem da medida provisória 495/2010, que altera a lei de licitações públicas ao conceder a margem de preferência de até 25% nas licitações estatais às empresas que investem em inovação.

Para fomentar a interação universidade-empresa, o governo federal implantou o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec), formado por 56 redes de núcleos de pesquisa e desenvolvimento, sendo 14 redes de centros de inovação, 20 de serviços tecnológicos e 22 de extensão organizadas nos Estados. Ainda há um longo caminho, mas passos importantes têm sido dados na direção correta.

As empresas já incorporam a inovação em seus processos produtivos, tornando-se mais competitivas e mais lucrativas. Isso oferece condições para a conquista de novos mercados. O país começa a formar uma nova geração de empresários, empreendedores em tecnologia.






SERGIO MACHADO REZENDE é ministro da Ciência e Tecnologia.

RONALDO MOTA é secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência e Tecnologia.

(imagem acima: FINEP/MCT)

terça-feira, 7 de setembro de 2010













Futebol, Copa e Inovação, tudo a ver



O Brasil é uma potência futebolística e é cobrado dessa forma. Se considerarmos as últimas 16 Copas do Mundo desde 1950, verificaremos que a seleção canarinho esteve em quase metade das finais (sete), tendo vencido cinco delas.


Futebol tem lógica, não tem determinação a priori; ou seja, favoritos existem, mas fazer do favoritismo fato demanda planejamento, organização e detalhes. Tanto tem lógica que essa última edição na África do Sul foi a primeira vez que o time da casa não passou da primeira fase; o que seria, em tese, lógico.


Houve períodos que jogadores fora do normal, com criatividade exacerbada, foram determinantes e quase sempre levaram os times onde eles atuavam a ganhar a Copa (ou próximo disso, no caso da Holanda de 1974). No contexto nacional, da mesma forma, outras variáveis foram tornadas determinantes para vencer campeonatos, tal como a preparação física inovadora, um patamar acima do usual na época, fizeram dos times do Rio Grande do Sul surpresas positivas, especialmente ao longo das décadas de 1970 e 1980. O preparo físico era então o diferencial, logo neutralizado pela incorporação das novidades pelos demais clubes.


Em suma, hoje em dia, também no futebol, inovação é um fator que pode ser determinante separando o sucesso do fracasso. No cenário mundial contemporâneo, inovação é reconhecidamente instrumento fundamental para todas as áreas. Inovação está presente como fator cada vez mais determinante na formação de recursos humanos envolvendo profissionais preparados para atender as demandas diversas e complexas da sociedade, inclusive da sociedade do futebol.


Inovar é a ousadia de romper com tradições e crenças não fundamentadas. Por exemplo, a Copa do Mundo são sete partidas somente e devem ser escalados aqueles que no período estão melhores preparados, sem receio de colocar no banco aqueles, ainda que famosos, não tenham demonstrado competência ou não estejam em sua melhor forma. Inovar é também não ter medo de errar, curiosamente caminho certo para acertar. Inovar é conjugar criatividade com disciplina e firmeza de propósitos.


O que mais precisamos no futebol brasileiro hoje é INOVAR, coincidentemente, o mesmo que precisamos em todos os espaços, em todos os recantos e setores, do mesmo país Brasil. Que bom que seja algo que sabemos fazer, não é?

sábado, 10 de julho de 2010



Um ano repleto de inovação




Nesta semana completo um ano na Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação-SETEC. Ainda que tivesse um conhecimento básico do tema associado, certamente tenho tido a oportunidade de aprender muito e consolidar conceitos sobre assuntos que estão longe de serem simples. Entre eles, o de inovação.


Não desejo apresentar um balanço, que não seria oportuno, mas um exercício livre de reflexão, com chance de contribuir com a discussão sobre inovação em si. Tanto as importantes ações da SETEC na consolidação do Sistema Brasileiro de Tecnologia-SIBRATEC, em conjunto com a Financiadora de Estudos e Projetos-FINEP, como as ações referentes à aplicação dos incentivos fiscais dirigidos às empresas inovadoras (Lei do Bem) ou aos programas em setores estratégicos, tais como energia e recursos minerais, dependem fortemente do amplo conceito associado à inovação.


No cenário mundial contemporâneo, inovação é reconhecidamente instrumento fundamental para o desenvolvimento sustentável, o crescimento econômico, a geração de emprego e renda e a democratização de oportunidades. Inovação também está presente como fator cada vez mais determinante na formação de recursos humanos envolvendo profissionais preparados para atender as demandas diversas e complexas da sociedade e de suas empresas inovadoras.


Interessante observar que inovação associa-se com vários elementos absolutamente essenciais. Entre eles, a inovação genética que permitiu que ao longo de um processo dinâmico de seleção das espécies a humanidade tivesse se construído. As inovações sociais que viabilizaram as tantas civilizações até os nossos dias. A inovação tecnológica com seu centro na máquina a vapor no séc. XVIII propiciou a explosão da revolução industrial e com ela as mudanças civilizatórias decorrentes.


Educação é outro campo que foi objeto de tantas inovações e com elas conviveu e se transformou, bem como ajudou a gerar outros tantos empreendimentos inovadores. Ao longo de sua história, teve pelo menos três etapas cruciais, começando pelas iniciativas na Grécia Antiga no séc. V a.C., da Academia e do Liceu no período de Sócrates, Platão e Aristóteles, quando se inovou na forma dos homens se relacionarem, especialmente em ensinar, em construir escolas e em estabelecer relações inéditas entre mestres e aprendizes. Posteriormente, um novo marco inovador deu-se a partir da invenção da Imprensa com Gutenberg, ao final da Idade Média no séc. XV. Por fim, e não menos importante, uma transformação educacional contemporânea, a terceira grande revolução, representada pelo universo das tecnologias educacionais inovadoras, da dominância de mídias e de sua adequada apropriação aos processos de ensino aprendizagem.


Enfim, seja em qualquer esfera, inovação hoje é reconhecidamente um dos fatores decisivos para o desenvolvimento econômico e social de uma nação. Indicadores de crescimento atuais demonstram que inovação contribui com mais da metade do Produto Interno Bruto (PIB) dos países, segundo os dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico-OCDE. No Brasil, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) e o Plano de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional (PACTI 2007-2010) consideram a inovação um dos fatores centrais para o fortalecimento sustentável da posição do Brasil no cenário internacional.


Assim, o conhecimento científico-tecnológico, bem como a inovação por ele engendrada, são patrimônios sociais que permitem gerar desenvolvimento sustentável, ampliando a produtividade e a competitividade do país, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida, através da aceleração da criação e qualificação de empregos, e a democratização de oportunidades. O conceito de inovação, em geral, é correlacionado com pesquisa e desenvolvimento (P&D), porém distinto e mais amplo, estando necessariamente associado à aplicação do conhecimento pelo mercado. Inovação implica tecnologia, máquinas e equipamentos, produtos e processos, mas vai além, contemplando também mudanças incrementais, novas funcionalidades, bem como melhorias na gestão ou novos modelos de negócios, associados à conquista ou criação de novos mercados.


As conexões entre ciência e tecnologia com inovação tecnológica têm uma face mais evidente no que diz respeito ao mundo das indústrias de manufatura. No entanto, deve-se considerar que, atualmente, entre metade e três quartos da riqueza produzida no planeta é criada não pela produção de coisas físicas, produtos, mas sim pela prestação de serviços.


Um ambiente que favorece a inovação nas empresas é induzido pela existência no país de ciência avançada e pela capacidade regional de formar recursos humanos de ponta, mesmo que estas últimas atividades tenham seus centros de atividades na academia. Favorecer inovação não significa que seja suficiente ter boa ciência e formação de recursos humanos. Boa ciência é imprescindível; só não é suficiente. O estímulo às atividades de risco faz parte do jogo que conecta a inovação com a oferta ao mercado de produtos, processos e novas funcionalidades. Viabilizar bons ambientes de negócios demanda, adicionalmente, um conjunto complexo de condições favoráveis em vários setores.


A perspectiva empresarial de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) como fonte de riqueza econômica é crucial para que as demandas de tecnologia e da inovação tenham seus processos de indução, adaptação e implementação agilizados e contribuam para que a ciência produzida tenha também como horizonte suas aplicações potenciais, sejam elas decorrentes de demandas empresariais ou da necessidade para execução de políticas públicas. É necessário integrar cada vez mais a política de C,T&I à política industrial para que as empresas sejam estimuladas a incorporar a inovação em seu processo produtivo, forma mais eficiente de aumentar sua competitividade global.


Parte do relativo sucesso do incremento recente de investimentos privados em P&D decorre de um conjunto de instrumentos de fomento ofertando recursos para crédito, subvenção e investimentos reembolsáveis e não-reembolsáveis, conforme possibilidades abertas pela Lei de Inovação, de dezembro de 2004, e pela Lei do Bem, de novembro de 2005, além da Lei de Informática, entre outras iniciativas. Ampliou-se assim o escopo das ações mais tradicionais e, em decorrência, o leque de opções de acesso para todos os tipos de empresa.


A subvenção, prevista na Lei de Inovação, administrada pela Finep, permitiu que nas áreas selecionadas uma subvenção não reembolsável de mais de R$ 1,5 bilhão tenha sido contemplada às empresas inovadoras nos últimos quatro anos. Valor esse complementado por vários outros investimentos de maior monta, especialmente reembolsáveis, acessíveis às empresas que inovam, em inúmeras outras modalidades operadas pela Finep e pelo Banco Nacional de desenvolvimento Econômico e Social-BNDES.


Por sua vez, a Lei do Bem concede incentivos fiscais para empresas que realizem atividades de pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica. Relativo ao ano de 2006, 130 empresas declararam investimentos em pesquisa e desenvolvimento de aproximadamente R$ 2,2 bilhões. Já em 2007 saltaram para 300 empresas declarando mais de R$ 5,1 bilhões. No ano passado (relativo ao ano de 2008), o número de empresas saltou para 460 e os investimentos atingiram cerca de R$ 8,8 bilhões. Ou seja, em apenas três anos o incremento de empresas é da ordem de 240% e de valores de 300%. Somente nesse item, os investimentos das empresas em pesquisa e desenvolvimento em relação ao PIB brasileiro, saltaram de 0,09% em 2006 para 0,19% em 2007 e atingiram 0,30% do PIB em 2008.


A SETEC, representando o MCT, coordena o Comitê Interministerial de Acompanhamento da Lei de Inovação, em conjunto com CAPES (representando o Ministério da Educação) e o Ministério do Desenvolvimento e Comércio Exterior e a Comissão Técnica Interministerial do Marco Legal da Inovação com representantes do MEC, do MDIC, do MP, MF e da SRB, às quais têm contribuído para identificar condições e situações jurídicas ou operacionais que dificultem ou limitem a aplicação da Lei de Inovação e da Lei do Bem; propor atos legais complementares ou iniciativas para aperfeiçoamento de dispositivos das Leis, inclusive aquelas explicitamente referenciadas; harmonizar e consolidar o entendimento das disposições desses marcos legais e seus atos suplementares, com vistas a orientar os órgãos e entidades alcançados por sua aplicação; e acompanhar a implementação das disposições previstas nas referidas Leis e seus atos suplementares.


O Programa SIBRATEC é fruto de uma visão de inovação que incorpora serviços tecnológicos e extensão como ingredientes a serem conjugados com inovação propriamente dito, tal que todas as dimensões sejam atendidas adequadamente. Sem metrologia de qualidade e laboratórios disponíveis capazes de confiavelmente avaliar a conformidade de produtos e processos, não há inovação que vigore no complexo campo das disputas comerciais. Assim, hoje temos 56 redes articuladas nacionalmente, sendo 20 de serviços tecnológicos, 22 de extensão, arranjadas estadualmente, e 14 redes de centros de inovação, que estabelecem pontes entre a excelência acadêmica e a efetiva demanda empresarial.


Para levar adiante os projetos de inovação e incrementar as parcerias entre empresas e academia, a SETEC tem atuado fortemente na consolidação dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs), os quais resultam da Lei de Inovação e de sua regulamentação. A criação, bem como sua consolidação, dos NITs nas Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs) está entre as ações previstas na Lei de Inovação, com a finalidade de propor, acompanhar e avaliar as políticas de inovação, visando a promoção, a proteção e a manutenção da propriedade intelectual e estimulando a transferência das novas tecnologias para o setor empresarial. A SETEC também tem apoiado a implantação e consolidação dos NITs nas Instituições Científicas e Tecnológicas por meio de Chamadas Públicas e da articulação com o Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia-FORTEC, que tem garantido um processo de disseminação da cultura da inovação e da proteção da propriedade intelectual proveniente das pesquisas acadêmicas e uma maior integração com as empresas no sentido da inovação. Assim, a SETEC, em conjunto com o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos-CGEE, o FORTEC, Capes, MDIC, Finep, entre outras entidades, está iniciando a organização da Conferência Nacional dos NITs, os quais hoje já são em número de 157 no País, evento esse previsto para novembro de 2010.

Quanto à propriedade intelectual no âmbito do MCT, recentemente a SETEC recuperou seu papel de coordenar internamente o Grupo Assessor de Propriedade Intelectual (GTA-PI) responsável por contribuir na consolidação de uma política unificada acerca d tema propriedade intelectual no Ministério.

Uma área também muito relevante de atuação da SETEC, fortemente aderente a inovação, refere-se aos incetivos fiscais para a criação e consolidação de empresas intensivas em tecnologia, tal como disposto no Programa Nacional de Apoio às Incubadoras e Parques Tecnológicos (PNI), por meio do estímulo a esses arranjos facilitadores do desenvolvimento econômico.

Segundo a Associação Nacional de Entidades promotoras de Empreendedorismo - ANPROTEC, como resultado do movimento das Incubadoras de Empresas, o quadro que se tem hoje é composto por cerca de oito mil empresas inovadoras, R$ 3,5 bilhões anuais de receita de empresas graduadas, 35 mil empregos qualificados diretos e impostos gerados de R$ 450 milhões anuais, sendo da ordem de R$ 500 milhões o total de investimentos ao longo dos últimos anos. Quanto aos Parques Tecnológicos, 74 iniciativias auto-identificadas existem no Brasil, de acordo com publicação da ANPROTEC em 2009..

Há que se destacar também o papel na divulgação da inovação e de seus instrumentos, por meio do Programa Pro-Inova, coordenado pela SETEC, e que no momento associa-se à Mobilização dos Empresários pela Inovação-MEI, iniciativa da Confederação Nacional da Indústria-CNI e que planeja como nova ação a curto e médio prazo a formação de milhares de gestores de inovação para as empresas, bem como estimular os correspondentes projetos e planos de inovação respectivos.


Em complemento, a SETEC, em conjunto com CNPq, por meio do Programa RHAE-Pesquisador na Empresa, em editais de âmbito nacional, com rodadas regularmente fixadas e amplamente divulgadas, já apoiaram 303 empresas com 1.750 bolsas para recursos humanos qualificados em apenas dois anos (2008/2009), ou ainda em ação conjunta e descentralizada com diversas FAPs das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, tem desenvolvido ações específicas para o aumento de pesquisadores mestres e doutores em setores empresariais, especialmente em empresas de micro, pequeno e médio porte, por meio da concessão de bolsas aos pesquisadores para o desenvolvimento de atividades de pesquisa tecnológica e de inovação.


Por fim, mas não menos relevante, cabe à SETEC a presidência de dois dos fundos setoriais: o de energia e o de recursos minerais. No primeiro (energia), além das ações de estímulo à inovação na área, temos participado juntamente com a Agência Nacional de Energia Elétrica-ANEEL da compatibilização e harmonização das políticas de aplicação dos recursos previstos no fundo setorial de energia bem como na ANEEL. Quanto às ações em recursos minerais, houve recentemente a formação de uma Comissão Interministerial (Minas e Energia e Ciência e Tecnologia) para definição de uma política nacional para os minerais estratégicos do País.


Ainda há um longo caminho a ser percorrido. Mesmo assim, é certo que passos importantes têm sido dados na direção correta e existem sinalizações claras de que a sociedade brasileira em geral e os empresários em especial vêm gradativamente incorporando o conceito de inovação nas suas agendas de investimentos. Enfim, inovação na sociedade e nas empresas tende a ser, cada vez mais, um item fundamental para medir o atual estágio de cada país ou região e ser especialmente útil para apontar possibilidades futuras e potenciais efetivos de desenvolvimento.


A SETEC/MCT pode e deve ter participação decisiva na consecução dessas tarefas, em especial naquelas funções que lhe são próprias e específicas. Nosso papel, circunscrito na temporalidade do cargo, deve ser o de consolidar os projetos e programas em curso, visando a garantir a continuidade necessária em função de uma política de Estado, condição imprescindível para que nos próximos 12 anos, que nos separam do bicentenário de nossa independência, o Brasil cumpra seu destino de ser uma nação soberana e justa.


Finalmente, ainda que durante o percurso, ressalto a confiança depositada pelo Ministro Sergio Rezende, o trabalho de excelência e solidariedade dos colegas da SETEC e do MCT, bem como de todos os demais parceiros neste um ano de aprendizagem, de muitas atividades e avanços.

(Imagem acima de MundoSEBRAE)

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Dez Tendências Educacionais no Brasil

Ronaldo Mota

A compreensão adequada do mundo atual passa por, a partir do conhecimento do passado e da percepção do presente, ampliar nossa capacidade em definir tendências. Estudar tendências não é o mesmo que prever futuros, mas sim tratar analiticamente as possibilidades múltiplas do futuro. Ou seja, em todas as áreas, é possível, enfrentar os desafios de apontar cenários, a partir das leituras que temos do presente e das análises que desenvolvemos sobre o passado. Educação é uma dessas áreas. Tais prospecções costumam, tradicionalmente, ser divididas em pelo menos dois blocos tradicionais, as megatendências e as microtendências. As primeiras dizem respeito às grandes evoluções visíveis e decorrentes do momento atual de forma mais direta e evidente. As segundas, por sua vez, caracterizam-se por aquelas pequenas forças capazes, potencialmente, de gerar mudanças também significativas, ainda que decorrentes de fenômenos em escalas menores.

A educação brasileira é um corpo macroscópico, relativamente pesado, com grande inércia, ainda que no seu interior movimentos de pequeníssimas escalas, que somente sobrevivem em função de suas reduzidas dimensões, continuem a brotar e fazer sentir seus efeitos na estrutura maior. Assim são as tendências educacionais.

A discussão aqui apresentada terá como centro a educação superior, muito embora os elementos do debate sirvam identicamente aos demais níveis educacionais. Mesmo assim, é evidente que o ensino superior é campo particularmente fértil para observarmos tendências educacionais.

Listaremos a seguir dez tendências educacionais, sendo que muitas delas se cruzam, compartilhando aspectos, espaços e motivações, mas todas têm em comum a escala e a repercussão potencial.


Tendência 1: Educação flexível, em oposição às modalidades tradicionais presencial e a distância

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei 9394, de 20 de dezembro de 1996) apresentou uma inovação no seu art. 80 abrindo oportunidades do ensino a distância em os níveis de ensino. A partir daí, corroborado por decretos e portarias sucessivos, cada vez se cristalizou um cenário de duas modalidades distintas e, à vezes, antagônicas: presencial e a distância.

Temos tido oportunidades de presenciar verdadeiros gladiadores em clima de guerra permanente defendendo os dois lados como se fora coisas distintas em permanente oposição. Bastante comum ouvir-se, por parte de incautos, frases do tipo: “não acredito em educação a distância”.

Nada mais insensato do que negar espaço às novas tecnologias na educação. Como pouco razoável seria esperar que a LCB de 1996, debatida à exaustão ao longo dos anos anteriores, fosse capaz de antever os avanços e níveis de acessibilidade das tecnologias inovadoras que temos hoje disponíveis ao mundo educacional.

Assim, emerge no cenário atual uma tendência denominada educação flexível, a qual incorpora as duas chamadas modalidades. Esta tendência surge em contraposição à caracterização macro geral que acredita nas duas modalidades como coisas separáveis, distintas e até mesmo antagônicas.

Enquanto se compararem presencial e a distância enquanto duas modalidades sem pontos de superposição, não haverá respostas boas, dado que sempre as perguntas serão erradas. A pergunta a ser respondida que permanece diz respeito às ferramentas que devemos utilizar para propiciar uma educação compatível com o mundo contemporâneo. Assim, não há resposta que se exima de contemplar os bons instrumentos presentes nas duas modalidades. Educação flexível, enquanto tendência, mas com enorme potencial, assim o faz.

O mundo do trabalho está a exigir profissionais mais bem formados do que simplesmente informados, onde a capacidade de trabalhar em equipe e a preparação para educação permanente ao longo da vida estejam presentes. Enfim, habilidades e competências capazes de fazer com que o profissional não tema o novo e esteja preparado para desafios, sejam eles quais forem. Tais ingredientes serão definidores do sucesso ou insucesso das empreitadas.

Assentado nos argumentos dos mecanismos autoinstrutivos tradicionais, buscando compatibilidade com os perfis dos estudantes atuais e com os futuros profissionais que pretendemos formar, as considerações apresentadas valem indistintamente para a modalidade presencial ou a distância.

As atividades propostas aos estudantes que precedem os momentos presenciais não têm a intenção de substituí-los, mas de prepará-los para uma nova dinâmica de sala de aula. As abordagens aqui propostas aproximam-se daquilo que costumamos denominar de modalidade híbrida flexível, a qual procura combinar os elementos mais adequados das duas modalidades, presencial e a distância.

As tecnologias inovadoras que puderem ser incorporadas são essenciais, ainda que ferramentas do processo, viabilizando que o conteúdo das disciplinas, bem como seus cronogramas e outras funcionalidades, estejam acessíveis aos estudantes desde os primeiros momentos da relação professor-estudante.

Educação flexível permitirá que num cenário próximo (de existência limitada no presente) que cada estudante ao início do calendário letivo possa, por exemplo, escolher algumas disciplinas com características mais presenciais e outras a distância. Aquelas hoje chamadas presenciais farão uso de muitas ferramentas que atualmente associamos com a distância. Por sua vez, as disciplinas ditas a distância incorporarão cada vez mais atributos da presencialidade, trabalhos em equipe com seus colegas, laboratórios etc., originalmente características que costumamos associar com a modalidade presencial.


Tendência 2: Andragogia versus pedagogia

A segunda tendência diz respeito às concepções andragógicas, associadas à necessidade de repensar nossas metodologias educacionais à luz do fato que boa parte de nossos estudantes da educação superior brasileira está alterando rapidamente seu perfil de faixa etária, origem sócio-econômica e suas expectativas.

Os dados do INEP apontam que já são mais de 40% das matrículas no ensino superior de estudantes com mais de 25 anos. No setor privado já é a maioria e com a expansão nas universidades federias, especialmente através de cursos noturnos, cruzaremos para a próxima década com a maioria dos estudantes neste novo perfil. Seria inaceitável se os as estruturas curriculares e os métodos de ensino-aprendizagem continuassem replicando as metodologias do ensino básico, as quais mesmo para aquele nível são questionáveis.

Os dados recentes do Instituto de Estudos e Pesquisas do Ministério da Educação (INEP) apontam que já são mais de 40% das matrículas no ensino superior de estudantes com mais de 25 anos. No setor privado já é a maioria e com a expansão nas universidades federias, especialmente através de cursos noturnos, cruzaremos para a próxima década com a maioria dos estudantes neste novo perfil. Seria inaceitável se os as estruturas curriculares e os métodos de ensino-aprendizagem continuassem replicando as metodologias do ensino básico, as quais mesmo para aquele nível são questionáveis.

Ainda assim, por incrível que pareça, a pedagogia (de paidós, criança em grego) permanece sendo a abordagem absolutamente dominante, independente e indistintamente de estarmos lidando com crianças, jovens, adultos ou população mais idosa.

Andragogia (derivado de andros, de homem, genericamente, adulto) não é conceito recente, mas a apropriação de suas idéias ocupa um espaço ainda tão ínfimo que educação de adultos chega a constituir-se em nicho de estudo de especialistas e obcecados, como se fora uma excepcionalidade, o que não é mais no mundo contemporâneo. Assim, a massa de adultos estudantes é macro, mas a sua percepção que gere efetiva ação, compatível com o tamanho do fenômeno, é desproporcionalmente pequena.

Na verdade, andragogia é um conceito educacional diferenciado, especialmente voltado à educação de adultos, permitindo oportunizar experiências educacionais inovadoras. Nessas abordagens, os estudantes têm um papel mais ativo em seus processos de aprendizagem, em coerência com as perspectivas de formação continuada e ao longo da vida, superando o período de educação escolar tradicional.

O centro do processo ensino-aprendizagem tradicional está na atuação do professor e calcado na concepção de transferência simples de conhecimento. Abordagens educacionais baseadas em inovadoras metodologias buscam centrar na aprendizagem do estudante e nas relações que ele estabelecia com o seu entorno, tanto as pessoas, as múltiplas relações estabelecidas, bem como suas experiências com a natureza que o cerca.

Dentro das abordagens andragógicas, haverá uma tendência crescente no sentido de recuperar o Método Keller. Trata-se de método, também conhecido como Processo Auto-Instrutivo, o qual faz uso de uma estratégia no processo ensino-aprendizagem que é diferente substancialmente das metodologias tradicionais, as quais são baseadas tipicamente em aulas expositivas como meio primário segundo o qual os estudantes tomam contato com a matéria.

Uma limitação percebida na aplicação do Método Keller ao final do século passado foi exatamente quanto à disponibilização adequada do material prévio ao estudante. Uma nova base tecnológica, propiciada pelos avanços recentes nas tecnologias de informação e comunicação, permite um novo momento e novas ferramentas. Assim, uma releitura positiva do tradicional Método Keller, à luz da incorporação efetiva das tecnologias inovadoras, é possível e imprescindível ser realizada.


Tendência 3: Compatibilizar o futuro profissional com o mundo contemporâneo

De fato, no que concerne às aulas tradicionais, pouco ou nada tem se alterado ao longo de décadas. O mundo extraeducação tem se alterado com rapidez e profundidade absurdas, enquanto as metodologias educacionais adotadas têm se mantido essencialmente as mesmas. O mundo altera em ritmo macro, a educação tradicional modifica-se em velocidade nano. O que esperar de um profissional, egresso de um curso superior, é tudo menos o mesmo, se compararmos décadas atrás com os tempos atuais. Um grande complicador é que o que se espera atualmente, em termos de competências, inclui os requisitos de ontem, demandando novos atributos sem abrir mão dos anteriores. Um resumo de todas as mudanças está na diferenciação entre competência técnica e competências múltiplas.

A radicalidade das mudanças necessárias invade todos os aspectos e ambientes, incluindo o espaço físico. No entanto, a sala de aula é sempre a mesma e reproduz e reforça o padrão do bom comportamento desejável do estudante calado. Sentado em fileiras, invariavelmente bem separadas e organizadas tal que, dispostos um atrás do outro, estejam maximamente distanciados. Preparados para copiar a fala do professor e estudar depois, tal como previsto e apregoado. O espaço organiza a não interação, o não discurso entre os pares, em total não sintonia com o mundo do trabalho em que os estudantes, no futuro, estarão imersos em suas vidas profissionais.

O aspecto comportamental é absolutamente crucial quando um profissional depara-se com um problema inédito, um tema inovador ou tecnologias recentes. Se ao longo do período escolar, o qual é rigorosamente infindo, essas emoções, que preparam para enfrentar desafios, não foram trabalhadas, este suposto cidadão, ainda que dominando as técnicas convencionais, terá enorme chance de fracasso.

Não é mais aceitável que a preparação para ambientes tão distintos, o passado e o futuro, seja a mesma. No entanto, em que pesem boas iniciativas recentes, em boa parte das práticas educacionais, os processos avaliativos ainda baseiam-se em relações simples e singulares entre um educando isolado e um problema discreto e dissociado.

A competência de liderança dos estudantes, a capacidade de assumir iniciativas, a habilidade gerencial, a valorização do potencial criativo e da sensibilidade quanto ao ambiente em que estão imersos são atributos que raramente estão presentes nas avaliações, tanto de ingresso como de saída, dos estudantes de graduação.

Para tratar do avesso do avesso, insisto que nada disso isenta a necessidade de profundo conhecimento dos aspectos técnicos específicos (capacidade técnica). Os estímulos às novas competências não menospreza o conhecimento tradicional e mesmo os procedimentos padrão de avaliação. Não se trata de substituir, mas sim de agregar. Ensinar não ficou mais simples, transformou-se em mais complexo, como a vida e o mundo do trabalho que nos cerca.


Tendência 4: Contribuições centrais dos laboratórios e do trabalho em equipe

Dois elementos educacionais, que por descuido têm sido entendidos como meramente complementares, são, de fato, essenciais no processo ensino-aprendizagem. São eles:1. o laboratório como espaço de prática, onde os conceitos são consolidados, os pensamentos abstratos assumem a solidez da experimentação e efetiva-se a oportunidade de erros e acertos, simulando o exercício mais próximo possível da atividade profissional, reforçando as bases do pensar segundo o método científico;2. o trabalho em equipe, onde aspectos primordiais do aprendizado são explorados, via construção coletiva, onde a percepção do(s) outro(s) é experimentada e desenvolvida, despertando e incrementando o (re)conhecimento das limitações e potencialidades, próprias e dos demais, além de ser espaço preferencial para cultivar o respeito à tolerância e à diversidade.

Em complemento à competência técnica, existem múltiplas habilidades a serem desenvolvidas e estimuladas. Entre elas, destaco a competência emocional, a capacidade de trabalhar em equipe e a vivência em laboratórios no enfrentamento de situações problemas, elementos em geral inexistentes, ou muito pouco explorados nos currículos típicos.

A dinâmica que leva esses dois elementos (trabalho em equipe e uso de laboratórios) de aspectos marginais pra centrais está fortemente relacionada ao perfil do futuro profissional que pretendemos formar Nossos tempos atuais diferem dos anteriores (uma década ou mais) por várias características. Destaquemos algumas:a) o mundo do trabalho costumava ser mais previsível, permitindo ser o conteúdo formativo mais definido;b) os limites de informações mínimas exigidas e necessárias eram mais bem delimitados, tal que os currículos e os programas das disciplinas duraram por anos, às vezes, décadas;c) as tecnologias envolvidas alteravam-se pouco e em ritmo compatível com preservar uma proximidade aceitável entre o que era utilizado em sala de aula e o que era demandado na vida profissional;d) uma vez formados, era até aconselhável novos estudos, mas, mesmo sem eles, havia espaço abundante de sobrevida na profissão;e) a maior parte das tarefas poderia ser realizada primordialmente de forma individual, quase solitária, ainda que inserida no coletivo; e f) a capacidade de texto, tanto interpretação como elaboração, era relativa, não causando grandes embaraçados a quem não a dominasse efetivamente.

Nenhuma das características acima permanece. Pelo contrário, um furacão parece ter varrido do mapa aqueles postulados, demandando novos paradigmas urgentes.

As instituições educacionais terão muita dificuldade em prever os desafios que seus estudantes, uma vez profissionais do mundo do trabalho, enfrentarão. Não por alguma deficiência delas, mas sim pelas características inerentes aos tempos atuais, onde os problemas que eles enfrentarão demandarão soluções que são exatamente aquelas associadas a questões de natureza imprevisível.

Assim, ter como elemento curricular, de alguma forma, o estímulo a como se portar perante o não previsto torna-se crucial. Por sinal, postura e solução são elementos igualmente relevantes para consolidar processos formativos capazes de encaminhar pessoas sem medo do inédito, do não previsto, do desafio a ser superado.

A partir de nossos tempos, a velocidade e facilidade de acesso à informação, bem como sua quantidade, se aceleram ao ponto de podermos definir que a informação não é mais um problema. A sua correta seleção e o seu adequado uso são os verdadeiros desafios envolvidos. A informação bruta sempre estará disponível, cada vez mais. O que fazer com ela passa a ser o ponto crítico. É o apogeu da memória dando espaço para o raciocínio. Passamos, rapidamente, de processos iminentemente informativos para essencialmente formativos. Não ficou mais simples, ficou mais complicado, porém, irrecorrível, dado que é assim que se molda o mundo atual.

As tecnologias costumavam durar mais. Idos tempos. A ficção confunde-se com o real exposto ao simples fluxo natural do relógio. A escala de tempo entre o ingresso e a formatura de um curso de graduação não resiste à comparação entre tecnologias disponíveis nas duas extremidades. É a não permanência das tecnologias. Ou seja, o início da prática profissional já defasará do começo do processo formativo, agravado pelo fato que o exercício tende naturalmente a se dar com equipamentos mais sofisticados que usualmente as escolas conseguem tentar acompanhar.

Dado o inevitável, há que se formar pessoas sem medo de inovações tecnológicas, sejam elas quais forem. Postura frente ao inédito passa a ser mais ou tão importante como conhecê-lo, dado que perene, permanente, hábito, costume.

Estamos no mundo da educação permanente, ao longo de toda vida, etapas que se sucedem, sendo estudantes para sempre. Ou nos acostumamos a esta nova realidade ou ela nos atropela.

São etapas infindas, sucessivas e permanentes.

O estudante ser mais ou menos sociável ou introspectivo tem sido tratado como da esfera individual e relativamente dissociado do processo avaliativo. Na verdade, os testes individuais, que são os dominantes, às vezes exclusivos, tendem a enaltecer somente elementos individualizantes, quase não percebendo ou computando características associadas ao comportamento no coletivo.

No entanto, a experiência de vida prática evidenciará como e em que medida a dimensão de saber trabalhar em equipe preponderará. Entender as limitações do outro, saber explorar as características positiva dos elementos de um grupo de trabalho, estabelecer sincronia e determinação coletiva e espírito de equipe definirão, na maior parte dos casos, o sucesso ou o insucesso de uma empreitada na vida real. Isso é válido em todas as esferas de atividades humanas, sem exceção, ainda que respeitadas as peculiaridades em cada uma delas.

Por fim, no passado a capacidade de comunicação escrita poderia ser, no limite, dispensada. Hoje passa a ser vital e central, sendo que os laboratórios e os trabalhos em equipe podem simular a melhor prática em direção a estimular tais habilidades. Da mesma forma, é estratégico para o bom processo formativo o hábito permanente da comunicação através das novas tecnologias e elementos multimídia como meio de expressão de uma idéia, bem como a capacidade de entender novos pensamentos e raciocínios sofisticados.


Tendência 5: Simples, basta estudar antes

Não há teoria educacional aceitável que não esteja baseada na prática. Pouco coopera também a prática dissociada e que dispensa teorias, dado que errática. Se um resumo fosse necessário para identificar de forma sintética a “novidade” ou “característica” do processo proposto, diria que o melhor seria: Simples, basta estudar antes. Pode parecer simples, mas essas experiências educacionais que trabalham com a devida priorização esse aspecto (estudar antes) têm escala nano comparadas à macro escala do ensino tradicional, no qual o estímulo central baseia-se no estudo após a aula. Há experiências em curso, mas elas ocorrem na escala de um para milhares, milhões ou mesmo bilhões de práticas tradicionais.

A proposta de estudar antes das aulas lembra, guardadas as diferenças e circunstâncias, uma frase presente nas manifestações estudantis de 1968 na França: sejamos realistas, peçamos o impossível! A semelhança entre o realismo e o impossível é o caminho em construção. Ninguém imagine a tarefa simples ou imediata.

Trata-se efetivamente de mudar uma cultura. Antiga por que calcada em hábitos que vem da educação básica e arraigada por que envolvendo todos os atores, tanto alunos como professores.

No entanto, não há outro caminho capaz de formar pessoas preparadas adequadamente aos nossos tempos, daí o realismo. Para termos noção da dimensão do problema, bom recordarmos que em nossa cultura educacional a criança com seis ou sete anos é obrigada a ir à escola. E é bom que seja assim. Os pais ou responsáveis respondem legalmente pelo não cumprimento dessa obrigação.

De forma que, mesmo empurrados pelos braços, os alunos iniciam a vida escolar no ensino fundamental e permanecem ao longo do ensino médio, para aqueles que atingem este nível. Em suma, permanecem as características de escola enquanto obrigação e o ideal do aluno associado fortemente ao ato de estudar, somente depois, aquilo que foi ministrado previamente em sala de aula.

Considerando que até o passado recente o ensino universitário era predominantemente de acesso às classes sociais médias e altas, o caso mais comum (típico) era de jovem em torno de vinte anos, seguindo para universidade quase por inércia, imediatamente após o ensino médio, por impulso social, quase sempre sem compromisso com o trabalho e com hábitos e costumes totalmente "grudados" naqueles mesmos do ensino médio.

Coerente com tal perfil, os métodos educacionais adotados não procuraram em nada destoar das metodologias pedagógicas anteriores, muitas vezes agravados pelo estímulo à memorização e preparação a responder questões, elementos típicos associados aos processos seletivos que ainda perduram.

Tal cenário tem sido invadido por todos os lados e, às vezes, demoramos em percebê-lo, dando uma sobrevida a algo que não mais responde às novas realidades. Os estudantes já não são os mesmos, sendo que na virada desta década, que estamos próximos, a maioria do corpo discente terá mais de vinte e cinco anos, serão casados, com filhos, trabalhando e, em geral, estudando à noite.


Tendência 6: Criatividade e o papel do docente

A civilização Micênica, em torno do século XVII a.C., constituiu-se no primeiro império do mundo ocidental em função de controlar o bronze e, a partir dele, obter ferramentas para uma agricultura, que gerava excedentes, e armas de guerra, que permitiram escravizar seus vizinhos. Foram, posteriormente, derrubados pelos Dórios, no século XII a.C., que, por sua vez, dominavam o ferro, superior ao bronze naquelas finalidades.Mais recentemente, houve um período da história da humanidade onde o país que controlasse as colônias, conseqüentemente o fluxo de matérias primas, transformava-se numa nação dominante. Em seguida, a prioridade esteve associada ao controle do processo industrial e da apropriada manipulação da ciência e, especialmente, da tecnologia dela decorrente.

Considerar o passado ajuda a entender o presente e ousar analisar o futuro. Temos muito poucos elementos para saber o que será, nos próximos anos, determinante na relação entre países e entre grupos sociais dentro de um mesmo país. No entanto, se tivéssemos que apostar, em uma única palavra, para definir o que está por vir como determinante, provavelmente, a palavra-chave seria criatividade.

De novo, não tem nada de inédito em ressaltar o estímulo à criatividade enquanto elemento central, mas as experiências que assim se traduzem ocorrem numa escala tão diminuta, quase imperceptível numericamente. No entanto, isso não minimiza a importância do tema. Ao contrário, a escala da relevância do tema é macro, ainda que as escalas em curso sejam pequenas.

A dificuldade, no entanto, começa por não termos uma definição precisa do que seja afinal criatividade. A mais abrangente abordagem trata do tema como estando associada, genericamente, à ação do indivíduo ou de um grupo, os quais, usando os símbolos e conceitos de um dado domínio, introduzem uma nova idéia e essa novidade é selecionada pelo coletivo como relevante para o desenvolvimento do próprio domínio.

Criatividade está também associada a processos de mudança, de desenvolvimento e de evolução na organização da vida subjetiva, através da manipulação de símbolos ou objetos externos para produzir um evento incomum para nós ou para nosso meio.

Seria mais adequado afirmar que dentro do amplo universo de conceitos sobre criatividade, eles se assemelham e muitas vezes se complementam. Os diversos conceitos estão ligados a estilos de pensamento, características de personalidade, valores e motivações pessoais ou coletivas, bem como a fatores de ordem social e normas previamente estabelecidas.

Portanto, criatividade está associada a variáveis diversas, contendo elementos de natureza complexa, de características multifacetadas, envolvendo uma interação dinâmica entre elementos relativos à pessoa, o coletivo, o ambiente, valores e normas culturais. A criatividade contempla associações e combinações inovadoras de planos, modelos, sentimentos, experiências e fatos.

Etimologicamente, criatividade deriva de criar, do latim creare, que significa dar existência ou estabelecer relações até então não configuradas no universo do indivíduo ou do coletivo.

Educacionalmente é preciso estabelecer que criatividade não é privilégio de selecionados, podendo e devendo ser desenvolvida através de determinadas condições que colaboram com suas manifestações ou com a amplificação das mesmas.

Mesmo não excluindo ninguém de potencial criativo, é certo também que alguns indivíduos já apresentam, naturalmente, maiores evidências desse padrão de comportamento curioso, investigativo e voltado à experimentação, tanto em suas áreas de interesse ou em terrenos nem tão familiares, envolvendo outras culturas, tecnologias, idiomas etc.

Acredita-se também que o potencial criativo tenha início na infância. Quando as crianças têm suas iniciativas criativas elogiadas e incentivadas pelos pais, tendem a serem adultos mais ousados e propensos a agirem de forma inovadora. O inverso também parece ser verdadeiro.

Enfim, embora não saibamos nenhuma regra pré-estabelecida, podemos elencar fatores que podem ser positivos ou negativos (estimulam ou inibem), os quais dependem das características presentes na organização e nas concepções e nas posturas de seus gestores.

A grande novidade que enfrentaremos, em futuro bem próximo, será menos provar a extrema relevância da criatividade, mas sim a convicção que se trata de algo que podemos despertar e estimular ou, alternativamente, reprimir, inibir e sufocar. Em especial, perceberemos, cada vez mais, que Educação tem tudo a ver com criatividade.

Assim, no campo educacional, a criatividade está relacionada com a capacidade de absorver, transformar e produzir conhecimentos, cabendo à escola garantir as necessidades fundamentais e propiciar o ambiente adequado para que o estudante seja estimulado a criar, a partir do que já foi aprendido, lidando com o novo e despertando valores positivos associados à invenção em geral e à descoberta de conhecimentos originais.

Partindo do pressuposto que criatividade é uma capacidade que pode ser estimulada, ela esta está relacionada de várias formas aos atos de ensinar e de aprender, através de suas metodologias, no sentido amplo do termo.No meio escolar, se o educando estiver inserido num ambiente acolhedor e prazeroso, estimulador da inventividade e do apreço pelo novo, certamente isso contribuirá (pelo menos haverá uma chance maior) para que ele seja um cidadão e um profissional mais criativo nas etapas posteriores.

Fundamental é estar exposto à criatividade, ou seja, propiciar oportunidades e incentivar a busca de novas experiências, motivando testar hipóteses e, principalmente, estabelecendo novas formas de diálogos. Este processo fica mais rico ainda quando realizado com pessoas de outras formações, com diversos tipos de experiências e provenientes de diferentes culturas.A dificuldade é que sabemos muito pouco acerca desse suposto ambiente acolhedor e estimulador da criatividade.

Curiosamente, sabemos muito mais sobre como inibi-la, como bloquear inventividades e como dar espaço ao desprezo e ao preconceito contra o novo. São muitos os exemplos desses obstáculos, incluindo ambientes escolares desmotivadores, metodologias ultrapassadas e desconectadas da realidade do educando, viés autoritário e repressor etc.

Costuma-se dizer que saber o que inibe criatividade não é desimportante, é muito importante. Ao identificarmos os elementos que cerceiam inovações, temos metade do caminho cumprido em direção a gerar os ingredientes que despertam a inventividade e deixam fluir a capacidade de criação. Certamente o papel do professor no contexto escolar é crucial nessa mediação de processos ensino-aprendizagem que tenham como preocupação central desinibir aspectos associados à criação. Cabe especialmente (não exclusivamente) ao docente a difícil identificação dos fatores influenciadores (estimulantes e inibidores) da inventividade no ambiente educacional.

Alguns autores, analisando aspectos da criatividade, caracterizam quatro tipos de fatores ou barreiras, potencialmente bloqueadores da inventividade, estando esses fatores associados a: a) emocionais, quando as emoções e sentimentos agem sobre a capacidade de pensar, de comunicar as idéias e opiniões, com receios diante da possibilidade de fracasso; b) culturais e ambientais, quando as idéias e concepções de uma determinada sociedade, cultura ou grupo atuam de forma a inibir a quebra de paradigmas das próprias crenças, dificultando a aceitação a um novo modo de pensar; c) de intelecto e de expressão, que interferem diretamente na formulação de idéias, gerando inibição e desconforto na forma de expô-las com clareza e convicção; d) de percepção, onde os obstáculos impedem compreender problemas ou as informações necessárias para a sua resolução.

As barreiras emocionais estão associadas às dificuldades do estudante em comunicar suas idéias por medo ou receio de uma possível rejeição ou de um eventual fracasso. Há que se criar, especialmente no espaço da sala de aula, um ambiente que valorize também o erro, tal qual o acerto, como elementos integrantes do mesmo processo de aprendizagem. O fracasso, ou aquilo que assim é entendido, deve ser lido como ingredientes motivadores na construção do processo dinâmico seguinte, tratando a superação com naturalidade. Não é simples essa construção, mas é fundamental que se persiga esta prática.Sobre os bloqueios culturais e ambientais, geradas por pressões sociais, culturais ou de um determinado grupo a que pertencemos, podem tornar não simples a aceitação de idéias diferentes ou divergentes daquelas tradicionalmente dominantes.

Bom destacar que se costuma associar o fato de maior diversidade de ritmos musicais a espaços mais propícios para o estímulo da criatividade. Haveria, em tese, uma correlação entre diversidade musical, seja ela produzida, praticada ou simplesmente ouvida, e ambientes criativos. Quanto mais ritmos musicais um grupo social, uma região ou um país dominam, praticam e divulgam, mais criativos tendem a ser seus habitantes ou componentes. Assim, ambientes que se caracterizam pela pluralidade, flexibilidade, diversidade e tolerância são, em princípio, mais propícios a derrubarem barreiras culturais e ambientais.Na escola, o professor, que além do conhecimento específico que o caracteriza, tem também um papel de orientador e facilitador, e deve estar atento a todas as situações. O ambiente escolar é composto por pessoas multiculturais e, felizmente, bastante diferentes entre si. Os preconceitos e pré-julgamentos devem ser pauta de discussões entre o corpo docente e o corpo discente para que todos possam compreender e respeitar as diferenças existentes dentro de qualquer grupo formado por pessoas. Ser diferente é normal.

Outro fator apontado por pesquisadores da área são as barreiras intelectuais. Essas barreiras bloqueiam a criatividade quando a escolha de (ou falta de) linguagens ou de estratégias para solucionar problemas acaba prejudicando, pois o indivíduo acaba desmotivado em buscar criativamente alternativas para transpor os problemas apresentados.Para que o desbloqueio intelectual, pode o docente trabalhar possíveis sistematizações de solução de problemas (existem várias), destacando os estágios clássicos envolvendo primeiramente a percepção do problema, a teorização do mesmo, o estímulo à inspiração sobre os possíveis caminhos, e, por fim, converter a idéia mental em idéia prática na busca da solução do problema proposto.

Dois elementos complementares contribuem para quebrar barreiras intelectuais. O estímulo à boa prática da expressão escrita, bem como da expressão oral, as quais compõem elementos determinantes no sucesso de qualquer profissional na realidade atual. Segundo, agrega-se a isso a capacidade de desenvolver-se e produzir em equipe, aspecto vital nas ações contemporâneas do mundo do trabalho. São elementos conectados, sendo que o trabalho em equipe é mecanismo fortemente estimulador da capacidade de comunicação, por sua vez as habilitadas de comunicação favorecem sobremaneira o trabalho em equipe.

Quanto ao bloqueio de percepção, um fator adicional que pode acarretar prejuízo é o excesso de informações, ou, especificamente, às vezes, de aulas expositivas, que, ao invés de clarear a respeito do que deve ser feito, acaba tendo um efeito contrário, gerando aquilo que Adams denominou “limites imaginários”.

Às vezes, os estudantes não conseguem avançar devido à ilusão da impossibilidade ou mesmo duvidam da capacidade própria de criar. Muito importante que o professor perceba, mais do que ninguém, que quando as pessoas sabem que suas ações serão valorizadas, parecem tender a criar mais. Quando sentem que não estão sob ameaça (de ser reprovados injustamente ou de cair no ridículo, por exemplo), os estudantes perdem o medo de inovar e revelam melhor suas habilidades criativas. Criatividade é o elemento mais importante dos processos educacionais do futuro e do presente.


Tendência 7: Artes e ofícios inovadores

A percepção e a compreensão acerca das artes e ofícios contemporâneos, que são caracterizados pela junção criatividade e inovação, ainda escalam na dimensão nano, ainda que já presentes raramente e em caráter quase pontual na educação superior, esta por sua vez tradicional na escala macro.

Nas décadas anteriores a formação em graduação nas diversas carreiras do ensino superior consistia basicamente em dotar os futuros formandos de um conjunto razoavelmente bem definido de conhecimentos específicos próprios de cada profissão. Tais conhecimentos contemplavam uma série de técnicas, métodos, procedimentos e uma formação geral associada a elementos específicos de cada área. Esses profissionais, assim preparados, enfrentavam, com relativo sucesso, uns mais outros menos, os desafios de um mundo do trabalho em algum nível previsível e programável.

O início deste novo milênio apresenta uma dinâmica acentuada, mudanças impressionantes em prazos muito curtos, com fortes impactos no mundo do trabalho, demandando um repensar urgente e profundo na concepção do que significa formar alguém para o mundo contemporâneo.

A área de formação de recursos humanos é, entre todos os setores, a mais atingida por tais alterações. Mesmo assim, na prática, as mudanças ainda que já presentes em nosso cenário educacional, têm sido ainda tímidas, incipientes, localizadas e demoradas, em especial nos processos típicos de ensino-aprendizagem. Se pudéssemos denominar, genericamente, aquelas técnicas e procedimentos, próprios das diversas carreiras, de ofícios, diríamos que o mundo contemporâneo permanece exigindo aqueles conhecimentos com o desafio de exigir muito mais.

Este universo adicional refere-se também a uma dimensão da educação permanente, de um aprender continuado, onde a consciência dessa característica e o estímulo à capacidade do aprender a aprender aproximassem-se mais de elementos do universo das artes do que propriamente dos ofícios. Trata-se de preparar para o inédito, de dotar alguém do potencial para enfrentar problemas e tecnologias que não conhecemos e desafios que terminantemente não somos capazes de prever. Com criatividade e posturas diferenciadas. Assim o novo, que demanda ser feito, está mais para preparar o artista do futuro, que também contemple o profissional tradicional de antigamente.

Ao contrário dos velhos ofícios, na visão das artes e dos ofícios integrados e conjugados não há receitas, há sim elementos motivadores, como, por exemplo, modificar o conceito de bom estudante. Na visão primeira, o bom aluno referia-se àquele capaz de, a partir do que foi ministrado em sala de aula, pelo professor, estudar em casa, e preparar-se para demonstrar esse conhecimento posteriormente.

No segundo enfoque, a partir de disponibilizado com antecedência o material referente ao conteúdo, os momentos das aulas assumem uma outra dimensão, propiciando aprofundamento dos temas em uma dinâmica bastante distinta do copiar para estudar depois, refletindo sim o estudado antes para aprofundar durante. Além disso, na visão anterior, priorizava-se o desempenho individual, no segundo o trabalho em grupo, formando pessoas capazes de trabalhar em equipe e desenvolverem-se coletivamente. Nos dois casos não deve haver simetria entre professor e estudante. Só que no tradicional, o professor reduz-se à transmissão e cobrança de um conhecimento limitado; no segundo, a dimensão do mestre se dá na seleção dos melhores conteúdos e no encaminhamento de um processo formativo capaz de preparar futuros profissionais, aptos a repetirem tais procedimentos em quaisquer circunstâncias, quando assim forem exigidos no trato de conhecimentos em expansão acelerada e acessível ilimitadamente. O estudante que chega à universidade, cada vez mais, não é somente aquele jovem, quase adolescente, que recentemente completou o ensino médio e quase precocemente definiu por esta ou aquela futura profissão. Majoritariamente teremos pessoas do mundo trabalho que largaram a escola há anos, casaram-se, tiveram filhos, e perceberam que as possibilidades de sucesso, em todas as dimensões desta palavra, estão associadas aos estudos permanentes. Fato é que o sistema de educação superior brasileiro, como regra, conserva ainda modelos de formação acadêmica e profissional superados em muitos aspectos, tendo prevalecido em tais modelos uma concepção fragmentada do conhecimento, que separava totalmente o artesão/profissional do artista, resultante de reformas universitárias das décadas de 1960-1970.

A arquitetura acadêmica dominante exclui, por exemplo, a educação artística, científica e humanística, nunca tendo sido possível conjugar simultânea e adequadamente as artes e os ofícios. Na graduação temos um sistema de títulos e denominações correlatas, caracterizado por inconsistências e nível inadequado de padronização. Os modelos acadêmicos vigentes, salvo exceções, incorporam currículos de graduação estreitos e rígidos, ainda calcados no viés dominantemente disciplinar, caracterizado, em geral, por uma não integração entre a graduação e a pós-graduação e por um divórcio entre transmissão e produção do conhecimento.

Atualmente estão em curso várias iniciativas visando construir inovadoras estruturas acadêmicas que favoreçam e estimulem a integração de competências específicas, incluindo profissionais cujos treinos sejam aprimorados pelo rigor de disciplinas formais, cientistas empíricos cuja educação resultará do intenso uso de novas ferramentas tecnológicas e, por fim, artistas que manipularão ferramentas com a habilidade daqueles que incorporam materiais inovadores em seus trabalhos.

A produção de conhecimentos, por sua vez, é também um fruto da conjugação dos ofícios e das artes. Isoladamente, há muita dificuldade em produzir conhecimentos e inovações realmente originais e de impacto no sistema produtivo do mundo contemporâneo.

Como já afirmado anteriormente, um país cresce quando é capaz de absorver conhecimentos, mas se torna forte, de verdade, quando é capaz de produzir conhecimentos. É a partir dessas da adoção dessas novas concepções, seja na transmissão como na produção do conhecimento, que se permitirá ao país uma inserção competitiva e soberana no mundo.


Tendência 8: Educação, inovação tecnológica e engenharias

Fenômeno já conhecido, talvez o que possa surpreender seja a escala com que ele se configure a partir daqui. Ou seja, as engenharias e as tecnologias saem de posições marginais para serem atores centrais no mundo das profissões no futuro próximo.

Não seria correto afirmar que as engenharias reduziram sua importância nos anos passados e sim que a formação dos engenheiros nas suas formas tradicionais não mais estava atendendo às novas dinâmicas. Por algum tempo as estruturas curriculares dos cursos de engenharia permaneceram inalterados enquanto o mundo do trabalho associado às funções tecnológicas mudou drasticamente. É correto igualmente afirmar que bastou o crescimento do país apresentar números positivos por dois anos consecutivos para que a carência desses profissionais ficasse mais evidente. A falta dos profissionais não pode e não esconde o duplo fenômeno, ou seja: faltam engenheiros e a formação que deles se espera demanda atualizações profundas. Interessante observar que o desafio está longe de ser simples. A nova demanda não exclui os conhecimentos tradicionais que os engenheiros devem ter, mas são apresentadas, adicionalmente, múltiplas outras exigências.

Aprender a trabalhar em equipe, saber expressar, tanto por escrito como oralmente, estar apto a enfrentar novas tecnologias, sejam elas quais forem, não temer desafios etc.. Enfim, além de toda a bagagem em termos de matemática, ciências e a formação específica de cada especialidade, dele se espera uma capacidade de gestão que se agrega à formação tecnológica de bom nível.


Tendência 9: O fim da mezo escala nas instituições de ensino superior

Vivemos um cenário de crise financeira mundial que favorece que fenômenos de escala sejam preponderantes na sobrevivência, sucesso ou desaparecimento de empresas em todos os ramos de atividades. Educação não diferente e as escolas privadas não estão imunes à crise, seja no que ela representa de crise ou de oportunidades.

Há uma tendência macro clara à incorporação das instituições menores pelas maiores, gerando a formação de empresas holding, as quais muitas vezes se estabelecem como capital aberto em bolsas de valores, espaços compartilhados de controle e de definição de valores.

Talvez seja ainda prematuro para emitir juízos definitivos de valor e tendências de ganho ou perda de qualidade. No entanto, é perceptível que tais movimentos caminham em direção à incorporação de metodologias educacionais padronizados, currículos unificados, ensino mais estruturados e cada vez menos espaço para metodologias inovadoras, dependente de conjunto específico de professores ou de especificidades regionais ou de propósitos peculiares a um certo contexto ou clientela.

Tende-se nas instituições componentes de um grande grupo a um processo de pasteurização metodológica, fruto do aproveitamento do fenômeno escala e otimização de custos.

É inegável que ao padronizar metodologias, via ensino estruturado, é possível que a nova dinâmica de grande empresa possa eventualmente acarretar melhoria de qualidade para instituições previamente muito deficientes e sem rumo. Igualmente, ao contrário, há exemplos de prejuízos de qualidade irreversíveis resultantes de gestão centralizada que menospreza e atropela diferenças associadas a abordagens que levavam em conta contextos regionais, especificidades históricas próprias e relacionamentos pessoais estabelecidos na instituição incorporada ao grupo maior.

Neste cenário macro, creio que sobreviverão , além dos grandes grupos, pequenas instituições , desde que consigam explorar suas especificidades e peculiaridades, bem como agilidade e ousadia de incorporar novos modelos acadêmicos. Fazer uso de suas escalas reduzidas, frente a uma conjuntura educacional em que todos estarão desafiados a se reestruturarem, pode ser uma agradável novidade em um cenário em que instituições de porte médio (mezoescala) tenderão a desaparecer.

Restarão em médio prazo, portanto, no setor educacional privado, em condições de enfrentar os períodos pós-crise, as grandes empresas, com seus atributos e fragilidades, e aquelas pequenas, quase familiares, fazendo uso intensivo de seus elementos diferenciais.


Tendência 10: Extrema judicialização versus abordagens educacionais

Está em curso uma febre jurídica que assola a educação superior no país. Baseados na fé da capacidade normativa abundam decretos, portarias, resoluções e órgãos. Em que pese a boa fé das iniciativas, nada mais são do que reflexos perversos da falta de perspectivas educacionais. A ausência do saber o que fazer educacionalmente é preenchida pela edição de normas, sem perceber que as normas não só não induzem qualidade como, ocasionalmente, a prejudicam sobremaneira.

Curiosamente, os instrumentos jurídicos criados, que têm seus estímulos principais no controle do setor privado, geram máquinas de desestímulo às necessárias inovações e ousadias acadêmicas, as quais, em geral, têm no terreno normativo extremado seus maiores inimigos.

As iniciativas educacionais de pequena escala emaranhado normativo macro judicializado poderão representar um fôlego, como uma brisa de ar fresco em uma sala já sem quase sem ar.

Em tese, o setor privado poderia estar igualmente experimentando novas experiências, em termos de modelos acadêmicos e adoção de metodologias inovadoras, com o mesmo vigor ou até mais disposição. Mas, definitivamente, não está.

As razões são múltiplas, mas o cerceamento normativo, fruto da extrema judicialização do ensino superior é uma das razões principais. Não se está fazendo uso, infelizmente, dos atributos resultantes de sua maior agilidade, de sua mais natural flexibilidade, especialmente em instituições de menor porte, e maior capacidade de impor comandos mais rapidamente.

As tendências acadêmicas experimentadas pelas pequenas instituições ousadas poderão no futuro próximo representar um desafio capaz de amedrontar o macro dragão dos empecilhos jurídicos normativos que ocupam os espaços educacionais.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

O que nos dizem os Rankings de Inovação sobre o Brasil e o mundo?


A recomendável sabedoria ao lidar com rankings é manter a necessária desconfiança, inerente aos seus limites naturais. São indicadores e números tentando captar essências, nem sempre com pleno sucesso. São importantes fotografias de algum tempo passado pretendendo explicar o filme do futuro. Mesmo assim, por outro lado, desaconselhável desconsiderar esses rankings ou menosprezá-los, dado que podem ser fontes interessantes de análise, às vezes imprescindíveis para formulação adequada de políticas públicas.

Inovação tende a ser cada vez mais um item fundamental para medir o atual estágio de cada país ou região e especialmente útil para apontar possibilidades futuras e potenciais efetivos de desenvolvimento. Assim, rankings de inovação tendem a ficar cada vez mais comuns e nem sempre recomendável que seus resultados sejam imediatamente aceitos como expressões únicas de verdades incontestáveis. Até mesmo porque inovação, por ser conceito relativamente recente, seus parâmetros são menos padronizados e ainda em processo de consolidação.

Em geral inovação e inovação tecnológica em particular implicam em agregação de qualidade e são requisitos essenciais para uma economia competitiva, próspera e sustentável, com melhores empregos e salários, e menor dependência de produtos e componentes importados e menos royalties pagos ao exterior.

Inovação é um conceito correlacionado com Pesquisa e Desenvolvimento empresarial, porém distinto e mais amplo. Inovação implica em tecnologia, máquinas e equipamentos, mas vai além, contemplando também pequenas mudanças incrementais, novas funcionalidades, bem como melhorias na gestão ou novos modelos de negócios, associados à conquista ou criação de novos mercados. Em um processo quase darwiniano, inovação em sentido amplo vem selecionando as empresas mais aptas. Especialmente para aquelas empresas com pretensões de mercados globais, a competição impõe inovação, em algum nível, como condição imprescindível.

Perceber a complexidade da inovação não resolve o problema, mas não ter essa sensibilidade prejudica muito a definição de políticas eficientes e eficazes para o setor. Assim, um ambiente inovativo nas empresas é favorecido pela existência no país de ciência avançada e pela capacidade regional de formar recursos humanos de ponta, mesmo que estas últimas atividades tenham seus centros de atividades na academia. Favorecer inovação não significa que seja suficiente ter boa ciência e formação de recursos humanos. O estímulo às atividades de risco (inovação também é risco) faz parte do jogo que conecta a inovação com a oferta ao mercado de produtos, processos e novas funcionalidades. Viabilizar bons ambientes de negócios demanda, adicionalmente, um conjunto não simples de externalidades positivas.

O que parece claro é que há poucos atalhos para, sem produção de conhecimento, conseguir estimular inovação nas empresas. Não é impossível ocorrer inovação nas empresas sem produção de conhecimento no país e recursos humanos de ponta na região, mas é evento tão raro que quase fortuito. Portanto, para propiciar inovação é importante que esses dois elementos estejam presentes simultaneamente: cooperação entre empresas e a academia bem como estímulo e suporte ao risco privado.

Muito embora indicadores atualizados mostrem que as empresas brasileiras têm avançado em inovação, provavelmente em ritmo superior a qualquer outra economia latino-americana, não há surpresa que alguns rankings não consigam ainda captar esse crescimento. Um desses casos, a título de exemplo, é o recente Relatório 2009-2010 sobre a Inovação para o Desenvolvimento (
http://www.innovationfordevelopmentreport.org/). Trata-se de um estudo coordenado pela "European Business School", uma instituição privada de ensino sediada na Alemanha.

No proposto ranking, a liderança mundial em capacidade de inovação entre os 131 países analisados está com a Suécia, com 82,8 pontos. Em seguida vem a Finlândia (77,8 pontos), Estados Unidos (77,5 pontos), Suíça (77,0 pontos) e Holanda (76,6 pontos). Até aí, nada de surpresas. Na América Latina, o Chile lidera com 59,4 pontos, seguido do Uruguai (posição 49a com 52,8 pontos), Costa Rica (58a, com 51,5 pontos), Peru (60a, com 50,6 pontos), México (61a, com 50,5 pontos), Colômbia (72a, com 48,0 pontos) e, finamente, próximo ao final da lista, o Brasil (87a, com 45,2 pontos).

Observar que, segundo esse ranking, o Chile seria líder em capacidade de inovação na América Latina, ocupando a 29a colocação entre os países avaliados, ficando imediatamente acima da Itália e abaixo da Espanha. Não deixa de ser estranha a posição brasileira, em relativo contraste com outras agências internacionais que ousam prognósticos muito positivos sobre o Brasil e sua situação econômica atual e perspectivas regionais e mundiais.

Segundo os organizadores daquele estudo, o ranking reflete o desempenho dos países no denominado "Índice de Capacidade de Inovação" (ICI), com base em cinco critérios: (1) Ambiente Institucional; (2) Capital Humano, Treinamento e Inclusão Social; (3) Arcabouço Regulatório e Legal; (4) Pesquisa e Desenvolvimento; e (5) Adoção e Uso de Tecnologias de Informação e Comunicação. Esses critérios se distribuem por 61variáveis.

O relatório ressalta que o Chile, comparativamente aos demais países da América Latina, apresenta melhor desempenho em questões como eficiência do Governo, império da lei, ausência de corrupção, balanço fiscal, número de escolas públicas conectadas à internet, facilidade para realizar pagamento de impostos, taxas de penetração de internet banda larga e confiabilidade na geração de eletricidade.

Anda segundo os organizadores do ranking, o Chile seria um "caso interessante", pois "provaria que políticas sólidas e boas Instituições não são o resultado, mas os motores da criação de riqueza e prosperidade". O sólido gerenciamento macroeconômico - incluindo uma das políticas fiscais mais virtuosas do mundo -, aliado às reformas institucionais e à abertura da economia para as vantagens do livre comércio, do investimento externo e da competição estrangeira, teria criado uma "confiável engrenagem de alto crescimento econômico e de redução da pobreza". As autoridades chilenas também teriam implementado "micro-políticas com o objetivo de aumentar a eficiência dos serviços públicos por meio de diversas plataformas eletrônicas, e facilitar o uso de TICs de maneira geral".

Acrescenta ainda que o desempenho do Chile em matéria de inovação é o resultado da construção gradual de ambiente institucional de apoio ao desenvolvimento do setor privado e da introdução de uma série de políticas voltadas para aumentar o uso da tecnologia e promover o incremento da produtividade. A isso se somaria o compromisso do governo com o "e-government", com vistas a aumentar a qualidade dos serviços entregues à sociedade pelo setor público. O relatório conclui dizendo que o Chile "está bem posicionado para alcançar os países mais ricos da União Européia".

Reconhecidamente o Chile tem diferenciais positivos em relação ao Brasil, especialmente em educação, seja no nível básico (menos analfabetismo e mais anos de escolaridade) ou no acesso à educação superior (quase 52% dos jovens entre 18 a 24 anos contra menos de 14% no Brasil). No entanto, de alguma forma os indicadores utilizados não captam a enorme diferença de produção científica entre os dois países. Ressalte-se que o Brasil, ocupando a 13a posição mundial, apresenta uma qualidade em pesquisa científica incomparavelmente superior ao Chile. Nossa pós-graduação, que forma em torno de 11 mil doutores e 35 mil mestres por ano, só é comparável em números ao restante da América Latina somada. Além disso, aplicamos mais de 1,3% do PIB em ciência e tecnologia, o dobro percentualmente do Chile (em torno de 0,7%) do PIB.

Deve-se destacar também que boa parte dos requisitos elogiados no Chile (gerenciamento macroeconômico, política fiscal, crescimento econômico junto com redução da pobreza, abertura da economia e livre comércio, altos investimentos externo etc.) também se aplica ao Brasil e talvez até com mais propriedade, ainda que o estudo específico não tenha detectado.

O Chile, além disso, reconhecidamente, apresenta escassa incorporação de tecnologia nos produtos de exportação (mais de 90% das exportações de bens correspondem a "commodities"), diferentemente das tecnologias agrícolas e pecuárias de ponta que resultaram em alta produtividade de parte substantiva da pauta de exportações brasileiras.

Especificamente quanto ao marco regulatório, um dos itens que pesou favoravelmente ao Chile, o Brasil acabou de implantar o seu conjunto de leis e decretos específicos. A Lei n˚ 10.973 da Inovação Tecnológica está completando cinco anos, sendo que, de fato, tem pouco mais de três anos de efetiva aplicação, dado ter sido complementada posteriormente com a Lei do Bem (Lei n˚ 11.196, promulgada em 21/11/2005).

A subvenção, prevista na Lei de Inovação, administrada pela Finep/MCT, permitiu que nas áreas selecionadas (TIC, Biotecnologia, Nanotecnologia, Energia, Saúde, Temas Estratégicos e Desenvolvimento Social) uma subvenção não reembolsável de mais de R$ 1,5 bilhão tenha sido contemplada às empresas inovadoras. Valor esse complementado por vários outros investimentos de maior monta, acessíveis às empresas que inovam, em inúmeras outras modalidades, especialmente reembolsáveis, operadas pela Finep e BNDES.

Por sua vez, a Lei do Bem, parte integrante da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, concede incentivos fiscais para empresas que realizem atividades de pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica. Trata-se de um programa que funciona via autodeclaração dos próprios empresários. A Lei do Bem tem estimulado que empresas declarantes em lucro real e que inovaram tecnologicamente aumentem seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento que em 2006 atingiram aproximadamente R$ 2,2 bilhões por parte de 130 empresas. Já em 2007 saltaram para 299 empresas declarando mais de R$ 5,1 bilhões.

Neste ano (observar que em 2009 computamos o ano fiscal 2008), o número de empresas saltou para 441 e os investimentos atingiram mais de R$ 8,1 bilhões. Ou seja, em apenas três anos, o incremento em número de empresas é da ordem de 240% e de valores de 270%. Somente nesse item, os investimentos das empresas em pesquisa e desenvolvimento em relação ao PIB brasileiro, saltaram de 0,09% em 2006 para 0,19% em 2007 e atingiram 0,28% do PIB em 2008. As áreas que têm até aqui feito uso mais intensivo da Lei da Bem são: Mecânica e Transportes, Petroquímica, Bens de Consumo, Metalurgia, Eletroeletrônica e Farmacêutica.

Em suma, talvez o ranking específico possa ter adotado indicadores que tenham captado menos alguns elementos positivos da realidade brasileira, mas nada que altere a essência, ou seja, que somos ainda um país carente em termos de inovação. O Brasil tem exemplos muito positivos e ações elogiáveis na área de inovação, mas nada que retire a marca de ser, predominantemente, um país que aprendeu a fazer ciência, produzir conhecimentos de ponta e formar recursos humanos do mais alto nível, sem ainda resultar na desejável transferência, no mesmo ritmo, desses conhecimentos ao setor empresarial.
(Imagem acima de Embrapa.br)